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Quinto – Vento da mudança

Sete de novembro, de dois mil e seis, meu esposo estava extremamente furioso conosco e com tudo, muito cansado pois, trabalhava em uma empresa de turismo e naquela semana fez duas viagens a São Paulo, havia ficado em casa apenas três horas em sete dias, chegou segunda-feira, dia seis, por volta das vinte e duas horas e o patrão lhe mandou fazer um horário da madrugada chegando em casa em torno das seis e trinta horas daquela manhã, cansado e se dizendo explorado. Dormiu até as sete e trinta e foi tratar dos seus assuntos particulares.

Era o último dia para emplacar a nossa camioneta, que era usada para o transporte de passageiros, ele havia adquirido um ano atrás e a estava equipando para sua aposentadoria, pois queria trabalhar na área de turismo que ele tanto gostava e tinha vasta experiência. Estava agitado na correria pois as dezessete horas tinha um outro horário para realizar para a empresa na qual ele era vinculado, estava contratando um motorista para trabalhar com o nosso veículo e também dando todas as instruções pois o mesmo estava prestando serviços para um resort da capital. Próximo às treze horas ele esteve em casa almoçou, estava acompanhado do motorista, eu disse-lhe: -Sai desta empresa e trabalha com o nosso carro vai dar certo. Ele respondeu-me: -Daqui a dois anos eu farei isto. Saiu apressado, também ia visitar a sua mãe. O motorista saiu com o veículo para finalizar todos os tramites das vistorias e deixar tudo em ordem. Antes de sair eu tentei acalma-lo, estava muito nervoso com a correria do dia, pedi para ele parar um pouco pois desta maneira ele estava agitando a todos. O filho caçula de treze anos pediu para o acompanha-lo, ao que ele respondeu: _Hoje não filho, o pai volta depois das onze horas e você tem aula amanhã.

FOI A ÚLTIMA VEZ QUE EU OUVI E VI O ESPOSO QUE EU CONHECIA A MUITOS ANOS.

Meu esposo a serviço da empresa de turismo em que trabalhava, como em outras ocasiões, fazia o transporte de estudantes para uma faculdade do município, e durante o espaço de tempo em que ficava aguardando para retornar ao término das aulas ele tomava a sua moto e continuava a realização de tarefas particulares pois o tempo de folga, praticamente não existia para a realização das mesmas

Vinte e três horas e trinta minutos o telefone toca, era o hospital ligando para comparecermos a emergência pois meu esposo havia sofrido um acidente, sem nos responder mais nenhuma pergunte solicitou, com voz calma a nossa presença na unidade, eu presumi imediatamente que algo muito grave havia ocorrido.

Na entrada me dirigi ao balcão indicado. Fitando-me de forma intrigante o funcionário pedia meus documentos e estranhamente perguntava se meu esposo coabitava comigo ao que respondi surpresa que sim, então lentamente passou a me apresentar seus pertences, a carteira com todos os valores, o celular, uma filmadora, tudo intacto.

Perguntei-lhe: _E meu esposo Ele me respondeu: -Somente na emergência. Assinei o recebimento dos pertences. Acompanhada de meu irmão e minha cunhada dirigimo-nos ao local indicado, lá chegando foi pedido para aguardar, em seguida um médico veio falar comigo, nos dirigimos a uma das salas, ele delicadamente disse-me: Seu esposo sofreu um acidente e o caso dele só DEUS. O diagnóstico era um TCE grave (TRAUMATISMO CRANIANO ENCEFÁLICO GRAVE), não tinha um edema externo ou trauma nos ossos nem sequer tinha qualquer arranhão, com a violência do choque, foi encontrado pela equipe de resgate do corpo de bombeiros de São José já sem respirar mais, foi feito os procedimentos no local trazendo-o de volta, sendo entubado posteriormente, pois não conseguia respirar sozinho, estava em coma. O laudo do atendimento registrava: RESSUSCITADO NO LOCAL.

                                           QUE MUDANÇA

 

Naquele dia sete de novembro, as dezesseis horas soprou um vento estranho sobre o meu bairro e eu senti algo em meu coração, como se a natureza soubesse tudo o que estava por vir e anunciava com seus sons, mostrava e advertia que algo estava errado ou acontecendo. Naquele exato momento algo acontece, ocorreu um terrível acidente em meu bairro, naquela noite no jornal  local uma triste noticia, seis crianças do  bairro morreram afogadas, quando brincavam em um pedalinho, em uma  propriedade particular. As vinte e uma horas e trinta minutos, nas margens da BR101, meu esposo capota a moto; este dia ficará registrado para sempre em nossas mentes.

Passados os primeiros momentos é transferido para uma unidade hospitalar da capital com unidade neurológica e fica em uma vaga na UTI, a médica responsável naquele plantão, Dra Isis após a internação e primeiras avaliações nos chama e diz: -O paciente está em coma, não é coma induzido, mas agora está sedado para aliviar as dores, vocês vão para casa descansem pois nada podem fazer aqui, retornem no horário de visita da UTI pois precisarão estar recuperados. Sim a vida segue agora tomando novos rumos, eu totalmente conturbada.

No dia seguinte oito  de novembro  de  dois  mil e seis, minha filha Raquel chega após o  serviço extremamente pálida e diz-me: _Mãe quando estávamos  esperando o  ônibus  um caminhão transportando uma máquina  que tinha uma  grande ponta erguida, passou arrebentando  a rede elétrica, vindo esta a cair sobre o ponto de ônibus onde nós estávamos, todos corremos, imediatamente outros veículos que trafegavam também se chocaram inclusive uma  viatura  de polícia, enfim, rapidamente a nossa volta e na frente, o caos se instalou. Minha colega de serviço que também estava comigo extremamente nervosa, foi para o meio da rua gritando com o primeiro motorista do caminhão e eu gritava a chamando, mas ela não escutava, eu corri em sua direção e a abracei trazendo para a calçada, ainda estou tremendo.

Neste momento eu me lembrei do sonho, dos fios e do voo da minha filha com aquela que eu supunha ser a sua irmã. Naqueles dias sucederam vários pequenos acidentes em meu bairro em diversos locais e entendi que era a ação daquela nuvem que eu havia visto.

Foram dez dias em coma, mais quatro em semi coma e mais dez dias internado. Chegando um final de semana um médico me anuncia a alta de meu esposo, eu lhe pergunto: _Que remédios irá tomar.  A resposta: -Nada. Estava eu no quarto ao lado de meu esposo totalmente alienado sem a menor consciência do que ocorria, em quase desespero eu pergunto-lhe: Como vou tratar dele, o que fazer, como levar para casa? Ele não dorme, o que faço? O médico que simplesmente se aproximara da porta do quarto me respondeu de forma rude: _Se a senhora quiser nós encaminhamos para a Colônia Santana. Eu respondi: _Jesus. Ele com um sorriso um pouco mais humano fala: -Em casa será melhor para a recuperação dele. O estado era lastimável, só que devido a total desorientação em que se encontrava não tinha consciência do que estava se passando, e o transtorno era atormentador pois não conseguia ficar um só segundo parado como também tinha que ser contido (amarrado) quando eu me afastava dele. Nestas condições foi assinada a alta de meu esposo. Liguei para minha filha que foi nos buscar no hospital. Quando estava pegando os papéis meu esposo jogava-se hora no chão ora sobre um pequeno sofá na recepção do sexto andar da unidade hospitalar, quando a assistente social olhou aquela cena, falou baixinho: _Este homem não tem condições de ir para casa e balançou a cabeça. Cada vez mais nervosa, tomei o elevador sozinha com meu esposo, passei momentos de verdadeiro terror pois ele ficou apavorado dentro do compartimento fechado e tornou-se extremamente agressivo querendo descer em todos os andares que infelizmente o elevador parava, em dado momento quando chegávamos ao térreo ele deu um soco na parede que, se fosse em mim não sei se teria sobrevivido pois alterou o aço.  Chegamos a saída ele ainda se jogou na recepção e com muito custo consegui tira-lo para fora do hospital, sentindo-me desampara, apavorada e expulsa daquele lugar. Lembrei-me, meu esposo trabalhou toda a sua vida, desde criança com sua carteira assinada, continuava trabalhando com a carteira assinada, tendo os seus descontos do SUS recolhido, mesmo assim era naquele momento, um JOÃO NINGUÉM, UM INDESEJADO EM UMA UNIDADE DO GOVERNO. Entramos no carro de minha filha, e nos dirigimos, para nossa casa; novo desespero, o fato de estar sentado lhe causava dores, o motivo: Além de todo o quadro relacionado com a confusão cerebral, a agitação, e conseguente efeito dos medicamentos ministrados para sair do coma, ele apresentou um quadro de trombose hemorroidária. Coloquei-o deitado em meu colo, mas mesmo assim havia um desespero queria saltar, tentava abrir a porta do carro em pleno movimento, deixando-nos assustadas e com muito custo, oração e forte perseverança chegamos em casa.

Entrou em casa como um transtornado e jogou-se no chão novamente.  Não reconhecia a família e nunca tive certeza se reconhecia a casa. Apenas reconheceu minha mãe. Passaram-se os dias ele não dormia ligamos para um médico amigo que acompanhara o caso e ele perguntou não receitaram nenhuma medicação e respondemos não, então minha filha foi até sua residência pegar um a receita. Em outras ocasiões de extrema dificuldades, era ligado para ele e ele nos orientava. OBRIGADO CARO AMIGO E PROFISSIONAL.

Em momentos de desespero em nossas vidas DEUS nos coloca ANJOS em forma humana para nos socorrerem ou nos ajudar a atravessar o caminho.

Dias depois nova crise de violência mais intensa e o médico nos disse ao descrevermos o sucedido sequela do TCEG, corram com ele para um psiquiatra pois é surto psicótico

Quando ainda no hospital este médico amigo nos havia falado, pois a todos os dias nos visitava e nos orientava ele disse para minha filha:

-Vocês vão receber uma criança recém-nascida em casa, pior do que uma criança porque é um adulto e assim foi, tudo o meu marido teve que reaprender e aos pouco sua memória começou a se recuperar, levou três meses para conseguir pentear os cabelos e começar a vestir-se.

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